Lugar do Crime
O art. 6º do CPB estabelece que:
“Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.”
Conceito
O art. 6º apresenta duas teorias conjugadas:
- Teoria da Atividade: o crime é considerado praticado onde houve a conduta (ação ou omissão).
- Teoria do Resultado: o crime é considerado praticado onde o resultado ocorre ou deveria ocorrer (exemplo: a morte em um homicídio).
A conjugação dessas teorias resolve conflitos de jurisdição e assegura que crimes a distância, como fraudes internacionais ou homicídios transnacionais, possam ser julgados no Brasil sempre que houver conexão com o território ou com os interesses nacionais.
Crimes Plurilocais
O dispositivo trata de forma especial os crimes plurilocais, que ocorrem em mais de um local. Por exemplo:
- Em um crime de homicídio planejado no Brasil, mas executado em outro país, considera-se que ele ocorreu em ambos os territórios (local do planejamento e local do resultado).
Exemplo prático:
Uma pessoa é envenenada no Brasil, mas vem a falecer já estando nos Estados Unidos. Nesse caso, o local da conduta seria o Brasil, e o local do resultado seria os Estados Unidos. De acordo com o art. 6º, ambos os lugares podem servir como marco para definir a prática do crime.
Ambiente Internacional e Interesse Nacional
A doutrina aplica esse dispositivo para assegurar que o Brasil tenha jurisdição em crimes que afetam interesses nacionais ou que de outra forma se conectem ao Estado brasileiro, mesmo quando os elementos do crime extrapolam fronteiras.
II. Extraterritorialidade (Artigo 7º do Código Penal Brasileiro)
O art. 7º do CPB regula a aplicação da lei penal brasileira para crimes cometidos fora do território nacional, dividindo tal aplicação em casos de extraterritorialidade incondicionada (inciso I) e extraterritorialidade condicionada (inciso II).
Extraterritorialidade Incondicionada (Inciso I)
A lei penal brasileira se aplica independentemente de outras condições, devido à gravidade dos crimes ou ao interesse do Estado brasileiro e/ou da ordem internacional. Esses casos abrangem:
- (a) Crimes contra a vida ou a liberdade do Presidente da República.
- (b) Crimes contra bens públicos (patrimônio ou fé pública) pertencentes à União, estados, Distrito Federal, municípios, autarquias ou estatais.
- (c) Crimes contra a Administração Pública, cometidos por quem está a serviço do Brasil.
- (d) Crime de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil.
Exemplos práticos:
- Um estrangeiro atenta contra a vida do Presidente da República em outro país — ele será julgado sob a legislação brasileira.
- Um administrador público brasileiro que comete desvio de verba no exterior responderá pelo crime no Brasil.
Punibilidade Absoluta (§ 1º):
Nos casos do inciso I, o agente será punido segundo a lei brasileira, ainda que tenha sido absolvido no estrangeiro ou já tenha cumprido pena por lá. Isso garante a soberania penal brasileira sobre esses delitos.
Extraterritorialidade Condicionada (Inciso II)
Para outros crimes, a aplicação da lei brasileira fora do território depende de certas condições (extraterritorialidade condicionada). Esses casos incluem:
- Crimes que o Brasil se obrigou a reprimir por tratado ou convenção internacional (exemplo: tráfico de drogas ou terrorismo).
- Crimes cometidos por brasileiros no estrangeiro (princípio da personalidade ativa).
- Crimes cometidos em aeronaves ou embarcações mercantes brasileiras privadas, desde que não sejam julgados no país estrangeiro.
Requisitos do § 2º para punibilidade:
Nos casos do inciso II, a lei brasileira só se aplica se:
- O agente entrar no Brasil;
- O crime for também punível no país onde foi praticado (dupla tipicidade);
- O crime permitir extradição segundo a legislação brasileira;
- O agente não tiver sido absolvido ou já cumprido pena no exterior;
- O crime não tiver sido perdoado ou a punibilidade extinta no país estrangeiro.
Exemplo prático:
Se um brasileiro comete estelionato na França e, ao retornar ao Brasil, não houve julgamento ou cumprimento de pena no outro país, ele poderá ser processado no Brasil.
Extraterritorialidade Passiva (§ 3º)
A lei brasileira também se aplica a crimes cometidos por estrangeiros contra brasileiros fora do território nacional, desde que se cumpram os requisitos do §2º e haja:
- Ausência de julgamento ou condenação no estrangeiro;
- Pedido de requisição do Ministro da Justiça.
III. Pena Cumprida no Estrangeiro (Artigo 8º do Código Penal Brasileiro)
De acordo com o art. 8º do CPB, quando o agente já tiver cumprido uma pena fora do Brasil pelo mesmo crime, este fato será considerado na aplicação da lei brasileira, de modo que:
- A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena a ser imposta no Brasil, se forem diversas.
- A pena cumprida no estrangeiro é integralmente computada na pena brasileira, caso sejam idênticas.
Essa regra evita a reestruturação punitiva excessiva e mantém o direito do Estado brasileiro de exercer sua soberania penal.
Exemplo prático:
Se um brasileiro cumpre 5 anos de prisão nos EUA por tráfico internacional de drogas e, ao retornar ao Brasil, é condenado pelo mesmo fato, os 5 anos já cumpridos podem ser computados ou atenuados.
IV. Eficácia da Sentença Estrangeira (Artigo 9º do Código Penal Brasileiro)
O art. 9º do CPB trata da homologação de sentenças estrangeiras, garantindo que estas possam produzir efeitos jurídicos no Brasil, desde que atinjam os seguintes objetivos:
- Reparação do Dano (art. 9º, I): A sentença estrangeira poderá obrigar o condenado a ressarcir o dano causado.
- Aplicação de Medidas de Segurança (art. 9º, II): Quando houver necessidade de proteger a sociedade contra o criminoso.
Condições para Homologação (§ único):
Para que a sentença estrangeira seja homologada no Brasil, é necessário:
- Um tratado de extradição com o país de onde emanou a sentença, ou a requisição do Ministro da Justiça.
- Pedido da vítima ou parte interessada, no caso de efeitos cíveis.
V. Princípios Amparados pela Doutrina e Jurisprudência
- Princípio da Soberania Penal:
- O Estado Brasileiro tem competência para aplicar sua lei penal sempre que houver conexão com bens ou direitos que estejam sob sua tutela, mesmo fora do território nacional.
- Princípio da Justiça Universal:
- Crimes graves, como genocídio ou terrorismo, podem ser julgados no Brasil, mesmo que praticados no exterior, independentemente da nacionalidade do agente.
- Princípio da Personalidade:
- A lei penal brasileira protege tanto os nacionais que cometerem crimes fora do país (personalidade ativa) quanto nacionais que forem vítimas de crimes por estrangeiros no exterior (personalidade passiva).
- Princípio da Territorialidade Ampliada:
- A jurisdição penal brasileira pode ser ampliada para incluir crimes cometidos a bordo de aeronaves ou embarcações registradas no Brasil.