
Controle Difuso ou Aberto de Constitucionalidade
O controle repressivo de constitucionalidade pelo Poder Judiciário, realizado pelo controle difuso ou aberto, é uma das formas de fiscalização que visa verificar a compatibilidade de normas ou atos normativos com a Constituição após sua entrada em vigor, ou seja, depois que a norma já passou a produzir efeitos no ordenamento jurídico. Este controle é caracterizado por ser descentralizado, podendo ser exercido por qualquer juiz ou tribunal, em qualquer instância do Poder Judiciário brasileiro, no curso de um caso concreto submetido à sua análise.
A seguir, apresento um estudo completo sobre o controle difuso ou aberto:
1. O que é o Controle Difuso ou Aberto de Constitucionalidade?
O controle difuso de constitucionalidade, também chamado de “aberto” ou incidente, é uma modalidade de fiscalização descentralizada que ocorre no julgamento de casos concretos. Nessa modalidade, cabe a qualquer órgão do Poder Judiciário analisar e declarar a inconstitucionalidade de normas ou atos normativos no âmbito de uma disputa judicial.
Características principais do controle difuso:
- Descentralizado: Todos os juízes e tribunais têm competência para realizar o controle difuso.
- Caso concreto: A declaração de inconstitucionalidade ocorre como uma questão preliminar (ou incidente) no curso de um caso submetido a julgamento.
- Efeitos vinculados às partes: A decisão no controle difuso, em regra, tem efeitos inter partes (aplica-se somente ao caso concreto, não retirando automaticamente a norma do ordenamento jurídico).
- Julgamento incidental: A análise constitucional é acessória à questão principal do processo.
2. Fundamento Legal e Constitucional
O controle difuso é decorrente do modelo norte-americano de controle de constitucionalidade e encontra amparo na Constituição Brasileira, sobretudo em normas que estruturam a atividade jurisdicional, tais como:
- Art. 5º, XXXV, da CF/88: Garante o direito à jurisdição e o acesso à Justiça, permitindo que qualquer pessoa questione, em processo judicial, a validade de uma norma ou ato normativo.
- Art. 97, da CF/88 (Cláusula de Reserva de Plenário): Exige que órgãos colegiados dos tribunais só possam declarar uma norma inconstitucional mediante decisão da maioria absoluta de seus membros.
Além disso, o Brasil adota o modelo misto ou híbrido de constitucionalidade, combinando o controle difuso (descentralizado) com o controle concentrado (centralizado), o último sendo de competência do Supremo Tribunal Federal (STF) ou de outros tribunais nos termos da lei.
3. Como funciona o Controle Difuso?
O controle difuso ocorre quando, ao julgar um caso concreto, o juiz ou tribunal verifica que a aplicação de uma norma (lei, ato normativo, decreto, etc.) é incompatível com a Constituição. Nessa hipótese, o magistrado poderá declará-la inconstitucional para resolver o caso em questão, afastando a aplicação do dispositivo normativo para as partes envolvidas no processo.
Procedimento no controle difuso:
- A questão constitucional surge de um caso concreto:
- Um indivíduo ou entidade ingressa com uma ação judicial, alegando que a norma aplicada ao caso é inconstitucional.
- Julgamento incidental:
- A análise constitucional é uma questão incidental, pois não é o pedido principal do processo. O principal objetivo da ação é obter um direito material ou individual, e a inconstitucionalidade é examinada como argumento para decidir a demanda.
- Decisão pelo juiz ou tribunal:
- Para juízes de primeira instância, basta a decisão fundamentada sobre a inconstitucionalidade da norma.
- Nos tribunais, a decisão de inconstitucionalidade está sujeita à Cláusula de Reserva de Plenário (Art. 97 da CF), que exige que o órgão colegiado decida pela maioria absoluta dos membros.
- Efeitos da decisão:
- Efeitos inter partes: A decisão, em regra, vincula apenas as partes do processo e resolve exclusivamente o caso concreto.
- A norma não é retirada automaticamente do ordenamento jurídico.
- Possibilidade de recurso:
- Caso o controle difuso envolva normas federais ou estaduais, e a decisão seja proferida em instância inferior, poderá haver recurso ao STF ou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para análise final, especialmente se a questão envolver matéria constitucional relevante.
4. Distinção entre Controle Difuso e Controle Concentrado
Tabela
Aspecto | Controle Difuso | Controle Concentrado |
---|---|---|
Natureza | Incidental, voltado a casos concretos. | Direto e abstrato, sem caso concreto. |
Competência | Qualquer juiz ou tribunal. | STF e outros tribunais, em hipóteses específicas. |
Efeitos da decisão | Inter partes (restrito às partes do processo). | Erga omnes (alcança todos, com efeitos gerais). |
Momento da análise | Durante a solução de um caso concreto. | A partir de um pedido abstrato de controle. |
Iniciativa | Partes de um processo judicial. | Legitimados pela Constituição (art. 103 da CF). |
5. Cláusula de Reserva de Plenário (Art. 97 da CF)
Uma regra fundamental para o controle difuso pelo Poder Judiciário é a aplicação do Art. 97 da Constituição, que estabelece a chamada Cláusula de Reserva de Plenário. Segundo essa cláusula:
- Órgãos Fracionários dos Tribunais (turmas, câmaras) não podem declarar a inconstitucionalidade de uma norma, salvo se houver decisão prévia do plenário ou do órgão especial do tribunal, com maioria absoluta dos membros.
Essa exigência busca garantir maior rigor e segurança jurídica nas decisões de controle difuso.
Exceção à Reserva de Plenário: Quando um tribunal apenas deixa de aplicar uma norma com base em decisão já proferida pelo STF ou pelo próprio plenário do tribunal, não é exigida nova deliberação.
6. Efeitos da Decisão no Controle Difuso
No controle difuso, a decisão de inconstitucionalidade obedece a algumas particularidades quanto aos seus efeitos:
a) Efeitos Inter Partes
- A decisão vale apenas para as partes envolvidas no processo em julgamento, não afetando terceiros.
- A norma inconstitucional continua em vigor para outros casos, até que seja objeto de julgamento em novo controle (difuso ou concentrado).
b) Possibilidade de Extensão Geral
- Repercussão Geral e STF:
- Caso o controle difuso seja decidido pelo STF e o tribunal reconheça a repercussão geral do tema, sua decisão poderá vincular outros processos similares em todo o país.
- Súmulas Vinculantes:
- O STF pode transformar sua decisão de controle difuso em Súmula Vinculante, alcançando todos os órgãos do Judiciário e da Administração Pública.
- Declaração de Inconstitucionalidade pelo Senado:
- De acordo com o Art. 52, X, da CF/88, o Senado Federal pode suspender a execução de uma norma declarada inconstitucional em controle difuso pelo STF, transformando seus efeitos inter partes em efeitos erga omnes.
7. Vantagens e Limitações do Controle Difuso
Vantagens:
- Democrático: Permite que qualquer cidadão levante a questão de inconstitucionalidade em casos concretos.
- Descentralização: Expande o papel do Judiciário ao possibilitar o controle por qualquer juiz ou tribunal.
- Flexibilidade: Possibilita uma análise contextual da norma, adaptada às peculiaridades do caso.
Limitações:
- Efeitos restritos: Em regra, vincula apenas as partes do processo, não solucionando plenamente o problema da inconstitucionalidade no sistema.
- Complexidade: Pode gerar insegurança jurídica, pois diferentes juízes ou tribunais podem ter entendimentos divergentes.
- Possibilidade de demora: A transformação dos efeitos inter partes em erga omnes depende da articulação de outros órgãos, como STF ou Senado.