Direito Processual Civil

Capacidade Processual

11/04/2025, Por: Wallace Matheus

A capacidade processual é elemento essencial para a correta condução dos processos judiciais, assegurando que todos os que participam das relações litigiosas estejam devidamente habilitados a atuar em juízo. O Código de Processo Civil (CPC) brasileiro regula com precisão desde os pressupostos para que uma pessoa possa estar em juízo até as sanções aplicáveis quando há vícios de representação. Essa regulação está contida no Livro III, Título I, Capítulo I do CPC e reflete um equilíbrio entre a proteção de sujeitos vulneráveis e o interesse público na efetividade e regularidade dos processos.

O estudo dos artigos 70 a 76 do CPC revela um conjunto de disposições que buscam regular o acesso à justiça, a tutela dos incapazes, a validação de atos processuais e as formas corretas de representação em juízo. Tais dispositivos são determinantes para preservar os direitos das partes e garantir a observância do contraditório e da ampla defesa.

Capacidade processual é a aptidão para exercer, por si só, direitos e obrigações judiciais. Está intrinsicamente vinculada à capacidade civil definida pelo direito material, mas ao mesmo tempo está cercada de nuances específicas que o processo demanda, especialmente em casos de indivíduos ou entidades com limitações legais.

A partir do artigo 70, a norma estabelece que toda pessoa que exerça direitos tem capacidade processual, reconhecendo a universalidade do acesso à jurisdição para aqueles com plena capacidade civil. Complementam essa noção dispositivos sobre a atuação de incapazes, a previsão de curadoria especial, a necessidade de consentimento para atos que impactem relações familiares ou patrimoniais, e as consequências de irregularidades no curso do processo.

O artigo 71 é determinante para os sujeitos incapazes que dependem de representantes legais (pais, tutores ou curadores). Ele assegura que a inabilidade jurídica para realizar atos por conta própria não comprometa o acesso à justiça. Essa previsão concretiza o princípio da isonomia e o direito de todos serem ouvidos em juízo, ainda que não detenham capacidade plena para conduzir litígios diretamente.


A CURADORIA ESPECIAL COMO GARANTIA

O artigo 72 merece destaque ao prever a nomeação obrigatória de um curador especial, especialmente quando o incapaz não tiver representante ou, ainda, nas hipóteses de conflitos de interesses entre o incapaz e seu representante. Essa curadoria é exercida pela Defensoria Pública, garantindo acesso à justiça e proteção integral dos interesses desses sujeitos. Essa normatização reparte com o Estado a responsabilidade de guardar direitos fundamentais de pessoas vulneráveis no processo judicial. É importante registrar que a curadoria também é prevista para réus revel citados por edital ou hora certa e presos que não constituíram defesa, salvaguardando o contraditório e a ampla defesa.


CONSENTIMENTO DO CÔNJUGE E EFICIÊNCIA PATRIMONIAL

O artigo 73 regula a participação dos cônjuges em demandas que envolvam direitos reais imobiliários, promovendo proteção patrimonial e o equilíbrio nas relações conjugais. Nas hipóteses previstas, proteção ao patrimônio comum exige que ambos os cônjuges sejam citados, sob pena de nulidade do processo. A aplicação dessa regra também é estendida às uniões estáveis formalmente comprovadas.

Vale ressaltar que a necessidade de consentimento pode ser suprida, conforme o artigo 74, desde que haja recusa injustificada. Essa flexibilização evita prejuízos ao andamento processual e protege a celeridade e a eficiência, sem desconsiderar a importância do consentimento.

É interessante observar que, quando ausente o consentimento necessário e este não foi suprido judicialmente, o ato processual é nulo, o que denota a gravidade da exigência.


REPRESENTAÇÃO DE PESSOAS JURÍDICAS E ENTIDADES

O artigo 75 organiza de maneira estruturada quem representa juridicamente pessoas jurídicas, entes públicos e associações. Em síntese, atribui a representação de tais entidades aos seus órgãos ou agentes designados por lei. Esse artigo é de grande importância prática, pois as pessoas jurídicas não possuem personalidade física, e sua presença em juízo depende de mandatários específicos.

Entre os pontos relevantes, destacam-se a representação da União pela Advocacia-Geral da União (AGU) e a presunção de que gerentes de filiais de pessoas jurídicas estrangeiras têm poderes para receber citações judiciais — elemento essencial para facilitar a tramitação processual e controle jurisdicional sobre entidades transnacionais.


CONSEQUÊNCIAS DA INCAPACIDADE OU IRREGULARIDADE

O artigo 76 reflete o compromisso do ordenamento jurídico com a preservação da validade dos atos processuais, ao prever que, constatada a incapacidade ou irregularidade de representação, o juiz deve suspender o processo e conceder prazo para sanar o vício. Caso contrário, as consequências podem ser severas: extinção do processo se o vício for do autor; revelia no caso de réu; ou desentranhamento de peças processuais no âmbito recursal.

Nesse contexto, o dispositivo reconcilia a segurança jurídica e a eficiência processual com oportunidades razoáveis para que litigantes corrijam eventuais falhas, evitando prejuízos desproporcionais.


PONTOS DE ATENÇÃO E OBSERVAÇÕES RELEVANTES

  • Proteção aos incapazes: o CPC segue princípios constitucionais, especialmente a dignidade da pessoa humana e a proteção aos vulneráveis.
  • Curador especial e Defensoria Pública: a participação obrigatória demonstra a importância das instituições públicas no acesso à justiça.
  • Consentimento nas relações conjugais: é essencial lembrar que estas regras protegem o equilíbrio patrimonial e preservam direitos, mas sua ausência justificada pode ser suprida de forma judicial.
  • Regularização processual: o artigo 76 alcança um balanço entre impedir dificuldades prolongadas em juízo e assegurar oportunidades justas para corrigir de falhas.

JURISPRUDÊNCIA E SÚMULAS RELACIONADAS

Súmula 621 do STJ sintetiza entendimento amplamente aplicado: “Os efeitos patrimoniais da união estável em relação a negócios jurídicos sobre imóveis dependem de registro em cartório”. Tal súmula reforça que o artigo 73, ao tratar do consentimento conjugal, tem paralelo na união estável, com exigências ainda detalhadas pelo direito de família.

Outra referência é a Súmula 253 do STF, que reconhece a necessidade de curadores especiais em determinadas circunstâncias, garantindo ampla defesa: “O curador no processo é indispensável quando há incapacidade absoluta ou dúvidas sobre o discernimento do interessado”.

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