Os Deveres das Partes, Procuradores e a Responsabilidade Processual
O Código de Processo Civil brasileiro dedica capítulos inteiros à regulamentação dos deveres das partes e de seus procuradores, buscando assegurar a lealdade processual, a eficiência dos atos e o respeito às normas e aos princípios que regem o devido processo legal. Além disso, o Código dispõe sobre as consequências jurídicas decorrentes de má conduta no processo, como as penalidades em caso de litigância de má-fé ou descumprimento de decisões judiciais. Este estudo detalhado abordará os principais dispositivos do Código de Processo Civil no que se refere aos deveres, aos custos processuais e à gratuidade da justiça, analisando-os sob a ótica da doutrina e da jurisprudência.
Os Deveres das Partes e de Seus Procuradores: Fundamentos e Aplicações
Os deveres elencados no artigo 77 do CPC expõem o comprometimento ético e jurídico esperado de todas as partes que participam do processo. Estes requisitos reforçam o princípio da boa-fé processual e visam coibir abusos ou condutas que possam prejudicar a ordem e a justiça.
Entre os principais deveres das partes (art. 77, CPC), destacam-se:
- Exposição da Verdade em Juízo: As partes devem agir de maneira honesta, trazendo apenas fatos que correspondam à realidade. Condutas como alterar a verdade dos fatos podem acarretar em graves consequências jurídicas (art. 80, inciso II, CPC).
- Proibição de Condutas Frívolas e Infundadas: Não apenas as partes devem evitar formular pretensões desprovidas de fundamento legal ou fático, mas também devem abster-se de produzir provas inúteis ou realizar atos desnecessários.
- Cumprimento de Decisões: Outro ponto fundamental é o dever de cumprir com exatidão as decisões judiciais, sejam elas provisórias ou finais. O descumprimento de tais determinações pode configurar ato atentatório à dignidade da justiça (art. 77, § 2º, CPC).
- Manutenção de Atualizações Cadastrais: A comunicação eficaz durante um processo depende que as partes mantenham atualizados seus endereços e contatos, sob pena de atrasos graves e prejuízos à tramitação.
Multas e Consequências por Atitudes Contrárias aos Deveres
O descumprimento dessas obrigações pode levar à imposição de multa de até 20% do valor da causa (art. 77, § 2º, CPC), além de eventuais sanções civis e criminais. A responsabilidade disciplinar também é aplicável aos advogados e procuradores, os quais respondem perante seus órgãos de classe.
Litigância de Má-Fé
Um dos papéis mais importantes do CPC é coibir o uso indevido do processo, garantindo que ele seja uma ferramenta para a busca da verdade e da justiça, e não uma forma de causar prejuízo à outra parte ou atrasar o andamento. A litigância de má-fé (artigos 79-81 do CPC) consolida essa preocupação.
O artigo 80 apresenta um rol exemplificativo de condutas que caracterizam a má-fé, sendo algumas:
- Deduzir pretensão contrária à lei: É considerado má-fé pleitear direitos manifestamente inexequíveis ou contrários a texto expresso de lei.
- Alteração da verdade dos fatos: Uma prática que pode comprometer a credibilidade das partes e a segurança jurídica.
- Resistência injustificada: Atos que tenham como único objetivo retardar o processo, como recursos protelatórios ou incidentes sem fundamento.
Consequências da Litigância de Má-Fé
A má-fé processual é severamente punida pela legislação brasileira. O juiz, de ofício ou a requerimento, pode condenar o litigante de má-fé ao pagamento de multa que varia entre 1% e 10% do valor da causa, além de impor obrigação de indenizar a parte contrária pelos prejuízos sofridos, incluindo despesas e honorários advocatícios.
Jurisprudência Relacionada
- STJ – Súmula 98: É inadmissível o recurso especial contra decisão que indefere liminar ou antecipa a tutela.
- STF – Supressão indevida de atos processuais: O Supremo Tribunal Federal já decidiu em diversos precedentes que a litigância de má-fé pode ser configurada pela manipulação do processo para gerar prejuízo desproporcional à parte contrária (Reclamação 18.348-SP).
Das Despesas e Honorários
Nos artigos 82 a 86, o CPC estabelece as diretrizes para a responsabilidade pelas despesas processuais, incluindo as custas judiciais, a remuneração de peritos e assistentes técnicos, além dos honorários advocatícios.
- Despesas Processuais: Incumbe ao autor antecipar as despesas processuais relacionadas a atos requeridos no processo (art. 82 do CPC). Caso vença a demanda, o autor tem o direito de ser ressarcido de tais valores pelo vencido (art. 90, CPC).
- Honorários Advocatícios: Estes são fixados proporcionalmente ao trabalho desempenhado pelo advogado e ao valor da causa ou proveito econômico obtido. As regras para sua determinação variam, com percentuais diferidos de acordo com o montante envolvido, a complexidade da causa e as partes em litígio.
- A Fazenda Pública e Honorários: Nas causas envolvendo a Fazenda Pública, há uma regulamentação especial quanto aos honorários, com percentuais escalonados e calculados com base na condenação ou proveito econômico.
Gratuidade da Justiça
A gratuidade da justiça, prevista nos artigos 98-102 do CPC, assegura o acesso ao Judiciário às pessoas físicas e jurídicas que não possuem condições financeiras de arcar com os custos do processo.
A Insuficiência de Recursos Como Condição
O pedido de gratuidade não pode ser indeferido sem antes haver prova inequívoca de que o requerente não preenche os pressupostos legais. Pessoas naturais, em regra, possuem presunção de veracidade quanto à alegação de insuficiência financeira (art. 99, § 3º, CPC).
Condicionamento em Caso de Sucumbência
Caso o beneficiário da gratuidade seja condenado ao pagamento de custas e honorários, a exigibilidade destas obrigações será suspensa, salvo demonstração de que ele, nos cinco anos subsequentes, deixou de estar em situação de insuficiência de recursos.