
O Processo Legislativo
01/05/2025 Wallace Matheus
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Tags:Resumo, Resumos Esquematizados
A Constituição Federal de 1988 estabelece, em seus artigos 59 a 75, os pilares do processo de criação das leis e dos mecanismos de controle dos gastos públicos no Brasil. Compreender essas seções é fundamental não apenas para entender o funcionamento do Estado brasileiro, mas também é um conhecimento indispensável para provas de concursos públicos, especialmente nas áreas jurídica e administrativa. Vamos detalhar os principais pontos desses artigos, como um guia de estudo.
O Processo Legislativo: (Arts. 59 a 69)
O Art. 59 funciona como um sumário, apresentando as espécies normativas que são elaboradas por meio do processo legislativo. São elas: Emendas à Constituição, Leis Complementares, Leis Ordinárias, Leis Delegadas, Medidas Provisórias, Decretos Legislativos e Resoluções. O parágrafo único deste artigo reserva à Lei Complementar a função de detalhar as normas sobre elaboração, redação, alteração e consolidação das leis (atualmente, essa função é cumprida pela Lei Complementar nº 95/1998).
Emendas à Constituição (Art. 60)
Alterar a Constituição é um processo complexo, demonstrando a rigidez da nossa Carta Magna.
- Iniciativa: Quem pode propor uma Emenda à Constituição (PEC)?
- No mínimo, 1/3 dos Deputados Federais ou 1/3 dos Senadores.
- O Presidente da República.
- Mais da metade das Assembleias Legislativas dos Estados, desde que cada uma se manifeste pela maioria relativa de seus membros.
- Limitações:
- Circunstanciais (ou Temporais): A Constituição não pode ser emendada durante intervenção federal, estado de defesa ou estado de sítio (§1º).
- Materiais (Cláusulas Pétreas): Não pode haver proposta de emenda que vise abolir (§4º):
- A forma federativa de Estado.
- O voto direto, secreto, universal e periódico.
- A separação dos Poderes.
- Os direitos e garantias individuais.
- Ponto de Atenção (Concursos): As Cláusulas Pétreas são um tema recorrente. Saiba identificá-las e entender que elas não podem ser suprimidas, embora possam ser alteradas para ampliar direitos.
- Tramitação: A proposta é discutida e votada em cada Casa do Congresso (Câmara e Senado), em dois turnos.
- Aprovação: Requer um quórum qualificado de três quintos (3/5) dos votos dos membros de cada Casa, em ambos os turnos (§2º).
- Observação: Note o quórum elevadíssimo, que reforça a rigidez constitucional.
- Promulgação: A emenda aprovada é promulgada pelas Mesas da Câmara e do Senado, não havendo sanção ou veto do Presidente da República (§3º).
- Proposta Rejeitada: Matéria de PEC rejeitada ou prejudicada não pode ser reapresentada na mesma sessão legislativa (§5º).
Leis Complementares e Ordinárias (Arts. 61 e 69)
São as leis mais comuns no ordenamento jurídico.
- Iniciativa (Art. 61): A proposição pode partir de:
- Membros ou Comissões da Câmara, do Senado ou do Congresso.
- Presidente da República.
- Supremo Tribunal Federal (STF).
- Tribunais Superiores.
- Procurador-Geral da República.
- Cidadãos (Iniciativa Popular – §2º): Exige assinatura de, no mínimo, 1% do eleitorado nacional, distribuído por pelo menos 5 Estados, com não menos de 0,3% dos eleitores de cada um deles. A proposta é apresentada à Câmara dos Deputados.
- Iniciativa Privativa do Presidente (Art. 61, §1º):
- Ponto de Atenção (Concursos): Este é um dos tópicos mais cobrados! Decore as matérias de iniciativa exclusiva do Presidente. Qualquer projeto de lei sobre esses temas iniciado por outro legitimado padece de vício de iniciativa (inconstitucionalidade formal). As principais são:
- Fixação ou modificação de efetivos das Forças Armadas.
- Criação de cargos/funções/empregos públicos na administração direta/autárquica ou aumento de remuneração.
- Organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária dos Territórios.
- Regime jurídico dos servidores públicos da União (provimento, estabilidade, aposentadoria).
- Organização do MP e Defensoria Pública da União; normas gerais para MP e DP dos Estados/DF/Territórios.
- Criação/extinção de Ministérios e órgãos da administração pública.
- Regime jurídico dos militares das Forças Armadas.
- Jurisprudência Relevante (STF): O STF entende que o rol do Art. 61, §1º é taxativo (numerus clausus) e deve ser interpretado restritivamente. Além disso, a sanção presidencial não convalida o vício de iniciativa. Estados e Municípios, por simetria, devem observar regras semelhantes de iniciativa reservada em suas Constituições e Leis Orgânicas para matérias pertinentes. (Referência: Diversas ADIs, e.g., ADI 2.867).
- Ponto de Atenção (Concursos): Este é um dos tópicos mais cobrados! Decore as matérias de iniciativa exclusiva do Presidente. Qualquer projeto de lei sobre esses temas iniciado por outro legitimado padece de vício de iniciativa (inconstitucionalidade formal). As principais são:
- Quórum de Aprovação (Art. 69):
- Leis Complementares: Exigem maioria absoluta (primeiro número inteiro acima da metade dos membros da Casa).
- Leis Ordinárias: Exigem maioria simples (ou relativa) (maioria dos votos dos presentes, desde que presente a maioria absoluta dos membros – Art. 47).
- Observação: A exigência de maioria absoluta para Leis Complementares se justifica porque elas tratam de matérias que a Constituição considerou mais sensíveis, exigindo um consenso maior.
Medidas Provisórias (MP – Art. 62)
Instrumento com força de lei, adotado pelo Presidente da República em caso de relevância e urgência.
- Requisitos: Relevância e Urgência (pressupostos constitucionais).
- Procedimento: Deve submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
- Vedações (Art. 62, §1º):
- Ponto de Atenção (Concursos): As vedações materiais à edição de MPs são cruciais! É vedada MP sobre:
- Nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos, direito eleitoral.
- Direito penal, processual penal e processual civil.
- Organização do Judiciário e MP, carreira e garantia de seus membros.
- Planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais/suplementares (salvo crédito extraordinário – Art. 167, §3º).
- Detenção ou sequestro de bens, poupança popular ou ativos financeiros.
- Matéria reservada à Lei Complementar.
- Matéria já aprovada pelo Congresso e pendente de sanção/veto.
- Ponto de Atenção (Concursos): As vedações materiais à edição de MPs são cruciais! É vedada MP sobre:
- Prazo e Eficácia: Perdem eficácia desde a edição se não convertidas em lei em 60 dias, prorrogáveis uma vez por igual período (§3º). O prazo suspende durante o recesso do Congresso (§4º).
- Conversão em Lei: A votação inicia na Câmara (§8º) e passa por uma comissão mista (§9º). Se não apreciada em 45 dias, entra em regime de urgência, trancando a pauta da Casa onde estiver (§6º).
- Rejeição ou Perda de Eficácia: O Congresso deve editar Decreto Legislativo para disciplinar as relações jurídicas decorrentes (§3º). Se não o fizer em 60 dias, as relações constituídas durante a vigência da MP continuam por ela regidas (§11). É vedada a reedição na mesma sessão legislativa (§10).
- Jurisprudência Relevante (STF): O STF admite o controle judicial dos pressupostos de relevância e urgência da MP, mas de forma excepcional, apenas quando há abuso evidente por parte do Presidente da República. (Referência: ADI 2.213 MC).
Leis Delegadas (Art. 68)
São elaboradas pelo Presidente da República, mediante delegação do Congresso Nacional, que a concede por meio de Resolução.
- Vedações: Não podem ser objeto de delegação atos de competência exclusiva do Congresso, da Câmara ou do Senado; matéria de Lei Complementar; nem legislação sobre organização do Judiciário/MP, nacionalidade/cidadania/direitos individuais/políticos/eleitorais, e planos plurianuais/diretrizes orçamentárias/orçamentos (§1º).
- Controle: A Resolução especificará o conteúdo e os termos. Se determinar apreciação pelo Congresso, esta será em votação única, sem emendas (§3º).
- Observação: É um instrumento raramente utilizado na prática.
Tramitação e Sanção/Veto (Arts. 63 a 67)
- Início da Tramitação (Art. 64): Projetos de iniciativa do Presidente, STF e Tribunais Superiores começam na Câmara dos Deputados.
- Regime de Urgência (Art. 64, §§1º a 4º): O Presidente pode solicitar urgência para seus projetos. Se Câmara e Senado não se manifestarem em 45 dias (cada Casa), a pauta é trancada (exceto matérias com prazo constitucional).
- Revisão entre as Casas (Art. 65): Projeto aprovado em uma Casa é revisto pela outra. Se aprovado sem alterações, vai à sanção. Se rejeitado, é arquivado. Se emendado, volta à Casa iniciadora para apreciar as emendas.
- Sanção e Veto (Art. 66):
- Projeto aprovado vai ao Presidente, que tem 15 dias úteis para sancionar (concordar) ou vetar (discordar, por inconstitucionalidade ou contrariedade ao interesse público).
- Sanção: Pode ser expressa ou tácita (silêncio após 15 dias úteis).
- Veto: Deve ser comunicado ao Presidente do Senado em 48h, com os motivos. Pode ser total ou parcial.
- Ponto de Atenção: O veto parcial só pode abranger texto integral de artigo, parágrafo, inciso ou alínea (§2º). Não se pode vetar uma palavra ou expressão isolada.
- Apreciação do Veto: O Congresso Nacional (sessão conjunta) tem 30 dias para apreciar o veto. A rejeição do veto exige maioria absoluta de Deputados e Senadores (§4º). Se o veto for rejeitado (derrubado), o projeto vai para promulgação do Presidente.
- Promulgação: Se a lei não for promulgada pelo Presidente nos prazos (após sanção tácita ou derrubada de veto), o Presidente do Senado o faz em 48h; se este não o fizer, cabe ao Vice-Presidente do Senado (§7º).
- Projeto Rejeitado (Art. 67): Matéria de projeto de lei rejeitado só pode ser objeto de novo projeto na mesma sessão legislativa por proposta da maioria absoluta dos membros de qualquer das Casas.
A Fiscalização Contábil, Financeira e Orçamentária (Arts. 70 a 75)
Esses artigos tratam do controle do uso do dinheiro público, essencial para a República e a democracia.
- Abrangência (Art. 70): A fiscalização abrange aspectos de legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação de subvenções e renúncia de receitas. Aplica-se à União e à administração direta e indireta.
- Tipos de Controle:
- Controle Externo: Exercido pelo Congresso Nacional, com o auxílio fundamental do Tribunal de Contas da União (TCU).
- Controle Interno: Cada Poder (Executivo, Legislativo, Judiciário) mantém seu sistema integrado de controle interno.
- Obrigatoriedade de Prestar Contas (Art. 70, Parágrafo único): Qualquer pessoa (física/jurídica, pública/privada) que gerencie recursos públicos deve prestar contas.
Controle Externo e o TCU (Art. 71)
- Ponto de Atenção (Concursos): As competências do TCU (Art. 71) são frequentemente cobradas. As principais são:
- Apreciar as contas anuais do Presidente da República (emite parecer prévio).
- Julgar as contas dos administradores públicos (responsáveis por dinheiro, bens, valores). Observação: Aqui o TCU julga, imputando débito e multa se necessário. A decisão tem eficácia de título executivo (§3º).
- Apreciar a legalidade dos atos de admissão de pessoal (exceto cargos em comissão) e concessão de aposentadorias, reformas e pensões, para fins de registro.
- Realizar inspeções e auditorias por iniciativa própria ou solicitação.
- Fiscalizar contas de empresas supranacionais com capital da União.
- Fiscalizar recursos federais repassados a Estados/Municípios.
- Aplicar sanções aos responsáveis por ilegalidades/irregularidades.
- Assinar prazo para cumprimento da lei.
- Sustar a execução de ato impugnado (se não atendido); no caso de contratos, a sustação é solicitada ao Congresso, que a adota (§1º). Se o Congresso/Executivo não agirem em 90 dias, o TCU decide (§2º).
- Representar ao Poder competente sobre irregularidades.
- TCU (Art. 73):
- Composição: 9 Ministros brasileiros.
- Requisitos para Ministro: Idade (35-70), idoneidade moral, notórios conhecimentos (jurídicos, contábeis, econômicos, financeiros ou de adm. pública), mais de 10 anos de função/atividade na área.
- Escolha: 1/3 pelo Presidente (com aprovação do Senado), 2/3 pelo Congresso Nacional.
- Garantias: As mesmas dos Ministros do STJ.
Controle Interno (Art. 74)
- Finalidades: Avaliar cumprimento de metas (PPA), execução de programas/orçamentos; comprovar legalidade e avaliar resultados (eficácia/eficiência) da gestão; controlar operações de crédito; apoiar o controle externo.
- Responsabilidade: Responsáveis pelo controle interno que tomarem conhecimento de irregularidade/ilegalidade devem comunicar ao TCU, sob pena de responsabilidade solidária (§1º).
- Controle Social: Qualquer cidadão, partido, associação ou sindicato pode denunciar irregularidades ao TCU (§2º).
