
Artigo 17: Os Partidos Políticos
O Artigo 17 da Constituição Federal de 1988 estabelece as bases para a existência e atuação dos partidos políticos no Brasil. Ele consagra a liberdade partidária como um dos fundamentos do regime democrático e do pluripartidarismo, mas também impõe limites e requisitos essenciais para garantir que os partidos atuem em conformidade com os interesses nacionais e os princípios democráticos.
Liberdade de Criação e Princípios Fundamentais
O caput do Artigo 17 assegura a liberdade para a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos. Essa liberdade, contudo, não é absoluta. Ela deve respeitar quatro pilares essenciais:
- Soberania Nacional: Os partidos não podem atuar contra os interesses maiores do país ou se submeter a influências estrangeiras indevidas.
- Regime Democrático: Devem operar dentro das regras da democracia, respeitando eleições livres, a alternância de poder e os direitos das minorias.
- Pluripartidarismo: O sistema deve permitir a coexistência de diversas correntes de opinião representadas em diferentes partidos, garantindo a diversidade ideológica.
- Direitos Fundamentais da Pessoa Humana: A atuação partidária não pode violar os direitos e garantias individuais e coletivos previstos na Constituição e em tratados internacionais.
Requisitos Essenciais (Preceitos)
Além dos princípios gerais, o caput estabelece preceitos específicos que os partidos devem observar:
- Caráter Nacional: Os partidos devem ter organização e atuação em âmbito nacional, não se restringindo a interesses meramente locais ou regionais.
- Proibição de Recursos Estrangeiros: É vedado receber dinheiro ou qualquer tipo de ajuda de entidades ou governos estrangeiros, bem como subordinar-se a eles. Isso visa proteger a soberania e a independência nacional.
- Prestação de Contas à Justiça Eleitoral: Os partidos devem ser transparentes quanto à origem e destino de seus recursos, prestando contas regularmente à Justiça Eleitoral, que fiscaliza a regularidade das finanças partidárias.
- Funcionamento Parlamentar: A atuação dos partidos no Congresso Nacional, Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais deve seguir as normas legais e regimentais.
Autonomia Partidária e Organização Interna
O § 1º garante aos partidos autonomia para definir sua estrutura interna, regras de organização, funcionamento, e critérios para escolha de candidatos. Eles também podem decidir sobre coligações em eleições majoritárias (Presidente, Governador, Senador, Prefeito).
- Atenção: É vedada a celebração de coligações nas eleições proporcionais (Deputados Federais, Estaduais, Distritais e Vereadores). Essa mudança (EC nº 97/2017) visa fortalecer a identidade partidária e reduzir a fragmentação política.
- Disciplina e Fidelidade Partidária: Os estatutos partidários devem conter normas sobre disciplina e fidelidade. A infidelidade partidária pode levar à perda do mandato, como veremos adiante.
Personalidade Jurídica e Registro
Conforme o § 2º, os partidos primeiro adquirem personalidade jurídica na forma da lei civil (registrando-se em cartório como pessoa jurídica de direito privado) e, posteriormente, devem registrar seus estatutos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Somente após o registro no TSE o partido está apto a participar do processo eleitoral e receber recursos públicos.
Cláusula de Desempenho (Barreira)
O § 3º estabelece a chamada cláusula de desempenho (ou cláusula de barreira), introduzida pela Emenda Constitucional nº 97/2017. Para ter direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, o partido precisa atender a pelo menos uma das seguintes condições nas eleições para a Câmara dos Deputados:
- Obter no mínimo 3% dos votos válidos em todo o país, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação (9 unidades), com um mínimo de 2% dos votos válidos em cada uma dessas unidades;
OU - Eleger pelo menos quinze Deputados Federais, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação (9 unidades).
- Ponto de Atenção: A cláusula de desempenho visa combater a fragmentação partidária, incentivando a formação de partidos com maior representatividade nacional e reduzindo o número de “partidos de aluguel”. Sua constitucionalidade foi confirmada pelo STF.
- Jurisprudência Relevante (STF): Na ADPF 445, o STF considerou que a Emenda Constitucional nº 97/2017, que instituiu a cláusula de desempenho, é constitucional, pois busca aperfeiçoar o sistema representativo e fortalecer a democracia, sem violar o pluripartidarismo ou a isonomia.
Vedação à Organização Paramilitar
O § 4º proíbe expressamente que os partidos políticos utilizem ou se estruturem como organizações paramilitares, reforçando o caráter civil e democrático da atuação partidária.
Direitos dos Eleitos por Partidos Sem Desempenho
O § 5º protege o mandato do candidato eleito por um partido que não atinja a cláusula de desempenho do § 3º. Esse eleito tem o mandato assegurado e pode se filiar a outro partido que tenha cumprido os requisitos, sem perder o mandato.
- Observação: Essa filiação, no entanto, não é considerada para fins de distribuição de recursos do fundo partidário ou tempo de Rádio/TV para o partido que o recebe. É uma janela para garantir a representação do eleito, mas sem transferir benefícios financeiros ou de mídia ao novo partido por conta dessa migração específica.
Fidelidade Partidária e Perda de Mandato
O § 6º trata da fidelidade partidária. A regra geral é que Deputados (Federais, Estaduais, Distritais) e Vereadores que se desligarem do partido pelo qual foram eleitos perderão o mandato.
- Exceções: A perda do mandato não ocorre em casos de:
- Anuência do partido: Se o próprio partido concordar com a desfiliação.
- Justa causa: Hipóteses estabelecidas em lei (atualmente regulamentadas pela Lei dos Partidos Políticos e resoluções do TSE), como: mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; grave discriminação política pessoal; e a janela partidária (período de 30 dias que antecede o prazo final de filiação para concorrer à eleição).
- Jurisprudência Relevante (STF/TSE): O STF (MS 26602, 26603, 26604) e o TSE (Consulta nº 1398, Resolução TSE nº 22.610/2007) firmaram o entendimento de que o mandato pertence ao partido (ou coligação, antes da vedação), e a infidelidade partidária sem justa causa implica a perda do cargo.Resumo da Posição do TSE (Res. 22.610/2007): Decreta a perda de cargo eletivo em decorrência de desfiliação partidária sem justa causa. As hipóteses de justa causa incluem incorporação ou fusão do partido, criação de novo partido, mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário, e grave discriminação pessoal.
- Atenção: A migração de partido, mesmo que por justa causa ou com anuência, não é computada para a distribuição de recursos do fundo partidário ou acesso ao Rádio/TV.
Ações Afirmativas: Mulheres e Pessoas Pretas/Pardas
Os parágrafos finais do Artigo 17 introduzem importantes ações afirmativas:
- § 7º: Exige que os partidos apliquem no mínimo 5% dos recursos do fundo partidário em programas para promover a participação política das mulheres.
- § 8º: Determina que, do montante do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e da parcela do fundo partidário destinada a campanhas, bem como do tempo de Rádio/TV, no mínimo 30% devem ser destinados às candidaturas femininas, de forma proporcional ao número de candidatas.
- § 9º: Estabelece (embora a redação no prompt esteja um pouco confusa, a interpretação consolidada e decisões judiciais apontam para isso) a obrigatoriedade de aplicação de recursos do FEFC e do fundo partidário de forma proporcional (geralmente seguindo a lógica dos 30% aplicados às mulheres, mas calculado sobre o total de candidaturas) para candidaturas de pessoas pretas e pardas. A distribuição deve considerar os critérios e estratégias definidos pelo partido.
- Jurisprudência Relevante (STF/TSE):
- ADI 5617 (STF): Confirmou a obrigatoriedade da reserva mínima de 30% do fundo partidário e do tempo de Rádio/TV para candidaturas femininas.ADPF 738 (STF) e Consulta TSE nº 0600306-47 (TSE): Determinaram que a distribuição dos recursos de campanha (FEFC e Fundo Partidário) e do tempo de Rádio/TV deve ser feita de forma proporcional entre candidatos brancos e negros (pretos e pardos), aplicando-se a cota mínima (geralmente interpretada como 30%, similar à cota de gênero) também para as candidaturas negras. O STF ressaltou que essa medida é fundamental para combater o racismo estrutural na política.
O Artigo 17 é denso e repleto de regras cruciais para o sistema político-partidário brasileiro. Para provas de concurso, foque especialmente em:
- Os princípios e preceitos do caput.
- A autonomia partidária e a vedação de coligações proporcionais (§ 1º).
- As condições exatas da cláusula de desempenho (§ 3º).
- A regra da fidelidade partidária, suas exceções (justa causa) e a consequência da perda do mandato (§ 6º).
- As cotas de financiamento e tempo de Rádio/TV para mulheres (§§ 7º e 8º) e pessoas pretas/pardas (§ 9º).
- As decisões relevantes do STF e TSE sobre esses temas (Cláusula de Desempenho, Fidelidade Partidária, Cotas de Gênero e Raça).