Direito Administrativo

Intervenção do Estado na Propriedade e Atuação no Domínio Econômico

29/05/2025, Por: Wallace Matheus
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O direito de propriedade, embora seja um direito fundamental previsto no art. 5º, inciso XXII, da Constituição Federal, não é absoluto no ordenamento jurídico brasileiro. O interesse público pode determinar restrições, limitações e até a perda da propriedade privada, com base na supremacia do interesse público sobre o privado. Esses mecanismos de intervenção do Estado sobre o direito de propriedade são essenciais tanto para a concretização de políticas públicas quanto para a promoção do desenvolvimento econômico-social.

Modalidades de Intervenção do Estado na Propriedade

Desapropriação

A desapropriação é o instituto pelo qual o Estado, mediante lei, retira compulsoriamente a propriedade privada, transferindo-a para o poder público ou para terceiros, com pagamento prévio de indenização, salvo em casos específicos (como desapropriação-sanção, cf. art. 5º, XXIV, CF).

Fundamento Constitucional:
Art. 5º, XXIV, CF/88:
“a lei assegurará ao proprietário o direito à indenização prévia e justa, em dinheiro, ressalvados os casos de desapropriação por interesse social, para fins de reforma agrária, conforme previsto no art. 184.”

Modalidades de desapropriação:

  • Por necessidade pública
  • Por utilidade pública
  • Por interesse social

Observações Importantes:

  • A indenização deve ser “justa, prévia e em dinheiro”, sendo a exceção à regra a desapropriação para fins de reforma agrária (indenização mediante títulos).
  • Não há retrocessão automática e o direito de retrocessão só ocorre se houver desvio de finalidade.

Súmula do STF:
Súmula 615:
“Não se admite ação rescisória de sentença proferida em desapropriação, pela qual se fixou valor da indenização, sob fundamento de erro de cálculo.”

Súmula 652:
“Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de recurso extraordinário fundado em alegado desrespeito ao princípio da justa indenização, quando a questão cinge-se ao valor fixado.”

Requisição

A requisição é o ato administrativo pelo qual o Estado, em situações emergenciais (ex: guerra, calamidade pública), utiliza temporariamente bens ou serviços particulares, com possibilidade de indenização posterior se houver dano.

Fundamento:
Art. 5º, XXV, CF:
“No caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano.”

Pontos de Atenção:

  • O uso é temporário e condicionado a risco iminente.
  • Só cabe indenização se houver efetivo dano.
  • A requisição é medida autoexecutória e de natureza administrativa.

Servidão Administrativa

A servidão administrativa é a restrição imposta ao proprietário para que o bem, sem perder a titularidade, sirva ao interesse público, permitindo ao Estado utilizar parte do imóvel (e.g. passagem de fios, canos, estradas, etc.).

Características:

  • É restritiva e não privativa da posse.
  • A propriedade se mantém, mas com limitações.
  • Exige prévia indenização se houver prejuízo.

Súmula do STJ:
Súmula 70:
“A indenização da servidão administrativa relativa a passagem de linhas de transmissão é devida apenas quando houver efetivo prejuízo.”

Ocupação Temporária

A ocupação temporária é o uso provisório do bem imóvel pelo Poder Público, geralmente para execução de obras ou serviços de utilidade pública, não implicando perda da propriedade.

Aspectos Relevantes:

  • Deve haver indenização caso haja danos.
  • É regulada pela Lei de Desapropriações (Decreto-Lei 3.365/1941, art. 36).
  • Tem prazo certo e finalidade específica.

Tombamento

O tombamento é a restrição que recai sobre o direito de propriedade para proteger bens de valor histórico, artístico, ambiental ou cultural, sem transferir a titularidade ou posse ao Poder Público.

Base Jurídica:

  • Decreto-Lei 25/1937
  • Art. 216, § 1º, CF/88

Pontos de Destaque:

  • O proprietário não pode destruir ou descaracterizar o bem.
  • Persistem direitos de uso, desde que não contrariem a finalidade de proteção.
  • Cabe indenização se houver limitação que inviabilize totalmente o uso econômico.

Súmula do STF:
Súmula 127:
“É legítima a aplicação de multa ao proprietário do bem tombado que, sem autorização, vier a destruí-lo ou adulterá-lo.”

Observações e Pontos de Atenção

  • Supremacia do Interesse Público: Todas as formas de intervenção estão alicerçadas no princípio da supremacia do interesse público sobre o privado.
  • Indenização: Sempre que houver restrição ou dano efetivo, em regra, o Estado deve indenizar, salvo se a limitação decorrer de obrigação legal inerente à função social da propriedade.
  • Limitações Administrativas versus Intervenção: Limitações administrativas (como restrições ambientais ou urbanísticas) não geram indenização, pois decorrem do dever geral de respeito à função social da propriedade.
  • Atuação no Domínio Econômico: O Estado pode atuar de forma direta (exploração de atividades econômicas) ou indireta (regulação, fiscalização e incentivo).

Referências:

  • José dos Santos Carvalho Filho, Manual de Direito Administrativo
  • Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito Administrativo
  • Constituição Federal de 1988
  • Decreto-Lei 3.365/1941
  • Decreto-Lei 25/1937
  • Jurisprudência e súmulas do STF/STJ.
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